O isolamento social é uma das medidas mais eficazes no controle da disseminação do COVID-19, porém, esse cenário traz desafios como o aumento da violência doméstica que já atinge 2 em cada 5 lares na região metropolitana de Belo Horizonte, de acordo com pesquisa realizada pelo Instituto Olhar/Netquest/Crisp-UFMG.
Engane-se quem pensa que violência doméstica é só aquela praticada pelos maridos contra suas esposas, ou companheiros contra companheiras. A jurisprudência dos Tribunais superiores já admitem a aplicação da lei em casos envolvendo namorados, casais homoafetivos, mãe e filha, padrasto e enteada, e irmãos. Também é importante ressaltar que não tem necessidade das pessoas envolvidas no fato morarem sob o mesmo teto, na mesma residência.
Em um Recurso Ordinário em habeas Corpus (RHC 27.622) o Ministro Relator considerou que a Lei Maria da penha foi criada para amparar as desigualdades presentes nas relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, embora a referida legislação tenha dado ênfase para a proteção da mulher, ela não deixou de lado os outros vulneráveis, como idosos e portadores de deficiência física.
Um bom exemplo está na mudança que a Lei Maria da Penha fez no art. 129, parágrafo 9º, do Código Penal, que agravou a pena para da lesão corporal em crimes praticado com violência doméstica, para vítimas em geral:
“Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:
Violência Doméstica (Incluído pela Lei nº 10.886, de 2004)
§ 9o Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: (Redação dada pela Lei nº 11.340, de 2006)
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos. (Redação dada pela Lei nº 11.340, de 2006)”
Em seu voto o Ministro Relator Jorge Mussi destacou:
“Com efeito, não obstante a Lei n. 11.340/06 tenha sido editada com o escopo de tutelar com mais rigor a violência perpetrada contra a mulher no âmbito doméstico, não se verifica qualquer irregularidade no acréscimo de pena operado pelo legislador ordinário no preceito secundário do § 9º do artigo 129 do Código Penal.
Na verdade, o referido diploma alterador foi introduzido no ordenamento jurídico para tutelar as desigualdades encontradas nas relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, e embora tenha dado enfoque à mulher, na maioria das vezes em desvantagem física frente ao homem, não se esqueceu dos demais agentes destas relações que também se encontram em situação de vulnerabilidade, como os portadores de deficiência, a exemplo do § 11 do artigo 129 do Código Penal, também alterado pela Lei n. 11.340/06.
Assim, embora as suas disposições específicas sejam voltadas à mulher, não é correto afirmar que o apenamento mais gravoso dado ao delito de lesões corporais praticado no âmbito das relações domésticas seria aplicável apenas quando a vítima fosse de tal gênero, pelo simples fato desta alteração ter se dado pela Lei n. 11.340/06, mais conhecida como Lei Maria da Penha, mormente porque observada a pertinência temática e a adequação da espécie normativa modificado”
A pesquisa realizada pela Universidade Federal de Minas Gerais apontou que durante o isolamento social imposto pela pandemia, 39,7% dos entrevistados sofreram algum tipo de violência doméstica, sendo que 6,5% afirmaram que isso ocorreu pela primeira vez neste período, e por fim traz que 9,4% relatam uma intensidade maior nas agressões.
Importante frisar que a Lei Maria da Penha traz diversos tipos de violência doméstica, não se restringindo apenas as agressões físicas, conforme traz o art.5º da lei nº11.340/06, que configura como violência doméstica qualquer ação que resulte sofrimento físico, sexual ou psicológico , além do dano patrimonial ou moral da vítima.