A lei de execuções penais traz em seu corpo todos os direitos, deveres da pessoa privada de liberdade, como também os parâmetros que o Estado tem que seguir para mante uma pessoa sob sua custódia, ponto este que infelizmente estamos distante de retirar do papel apesar de já ter passado 35 anos da edição da legislação.
Já em seu artigo inaugural a lei nº 7.210/84 traz:
“Art. 1º A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.”
Como bem sabemos as prisões do Brasil estão longe de garantir condições harmônicas para a integração social do condenado e do internado.
Porém, na tentativa de reintegrar futuramente o apenado à sociedade, a lei de execuções penais traz benefícios para que o preso busque ocupar seu tempo com o trabalho ou estudo.
É direito do preso ter sua pena remida através do trabalho e/ou do estudo, conforme traz o art.126 da LEP:
“Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena.
§ 1o A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de: (Redação dada pela Lei nº 12.433, de 2011)
I – 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar – atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional – divididas, no mínimo, em 3 (três) dias; (Incluído pela Lei nº 12.433, de 2011)”
Ao ler art.126 e seu parágrafo ficamos com a sensação de que para o preso ter sua pena remida através do estudo ele necessita frequentar um curso regular, sendo ele de ensino fundamental, médio, superior, profissionalizante ou até mesmo de requalificação profissional. O referido dispositivo legal não traz nada sobre o preso estudar por conta própria e mesmo assim ter seus dias remidos.
Entretanto, através da recomendação n.44 do Conselho Nacional de Justiça, passou-se a admitir o estudo por conta própria ou com um simples acompanhamento pedagógico, desde que o preso obtenha êxito na aprovação nos exames nacionais que certificam a conclusão do ensino fundamental, ou o Exame Nacional do Ensino Médio, o ENEM.
Diz o art. 1º, inciso IV, da Recomendação n.44, de 26 de novembro de 2013, do Conselho Nacional de Justiça:
“IV – ha hipótese de o apenado não estar, circunstancialmente, vinculado a atividades regulares de ensino no interior do estabelecimento penal e realizar estudos por conta própria, ou com simples acompanhamento pedagógico, logrando, com isso, obter aprovação nos exames nacionais que certificam a conclusão do ensino fundamental Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (ENCCEJA) ou médio Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), a fim de se dar plena aplicação ao disposto no §5º do art. 126 da LEP (Lei n.7.210/84), considerar, como base de cálculo para fins de cômputo das horas, visando à remição da pena pelo estudo, 50% (cinquenta por cento) da carga horária definida legalmente para cada nível de ensino fundamental ou médio – art. 4º, incisos II, III e seu parágrafo único, todos da Resolução n.03/2010, do CNE, isto é, 1600 (mil e seiscentas) horas para os anos finais do ensino fundamental e 1200 (mil e duzentas) horas para o ensino médio ou educação profissional técnica de nível médio”.
Apesar de ser apenas uma recomendação do Conselho Nacional de Justiça a jurisprudência atual tem acompanhado, concedendo a remissão aos apenadas que logram êxito na aprovação destes exames.
Em decisão do Superior Tribunal e Justiça, conforme demonstra o Habeas Corpus nº 382.780/PR, o STJ decidiu:
HABEAS CORPUS Nº 382.780 – PR (2016/0329320-8)
RELATOR : MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA
IMPETRANTE : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO PARANÁ
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO PARANÁ
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ
PACIENTE : SAMARA CRISTINA CARVALHO MONTEIRO PINHEIRO
EMENTA
HABEAS CORPUS. HABEAS CORPUS SUBSTITUTO DE RECURSO. NÃO CABIMENTO. EXECUÇÃO PENAL. REMIÇÃO DA PENA. RECOMENDAÇÃO N. 44/2013 DO CNJ. APROVAÇÃO NO ENEM. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA FRATERNIDADE. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.
1. O Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, e a Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade.
2. Esta Corte possui orientação no sentido de que “a norma do art. 126 da LEP, ao possibilitar a abreviação da pena, tem por objetivo a ressocialização do condenado, sendo possível o uso da analogia in bonam partem, que admita o benefício em comento, em razão de atividades que não estejam expressas no texto legal” (REsp n. 744.032/SP, Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJe 5/6/2006).
3. No caso, a aprovação da paciente no ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) configura aproveitamento dos estudos realizados durante a execução da pena, conforme o art. 126 da LEP e Recomendação nº 44/2013 do CNJ.
4. Essa particular forma de parametrar a interpretação da lei (no caso, a LEP)é a que mais se aproxima da Constituição Federal, que faz da cidadania e da dignidade da pessoa humana dois de seus fundamentos (incisos II e III do art. 1º). Mais: Constituição que tem por objetivos fundamentais erradicar a marginalização e construir uma sociedade livre, justa e solidária (incisos I e III do art. 3º). Tudo na perspectiva da construção do tipo ideal de sociedade que o preâmbulo de nossa Constituição caracteriza como “fraterna” (HC 94163, Relator (a): Min. CARLOS BRITTO, Primeira Turma, julgado em 02/12/2008, DJe-200 DIVULG 22-10-2009 PUBLIC 23-10-2009 EMENT VOL-02379-04 PP-00851).
5. Com efeito, a interpretação dada ao art. 126 da LEP, pelo Superior Tribunal de Justiça, decorre, indiscutivelmente, desse resgate constitucional do princípio da fraternidade.
6. Após a divulgação ampla pelo Conselho Nacional de Justiça das chamadas “Regras de Mandela”, aprovadas pela Assembleia Geral das Nações Unidas, segundo as quais, além da busca pela proteção da sociedade contra a criminalidade, a redução da reincidência e a punição pela prática do crime, também constituem objetivos do sistema de justiça criminal a reabilitação social e a reintegração das pessoas privadas de liberdade, assegurando-lhes, na medida do possível, que, ao retornarem à sociedade, sejam capazes de levar uma vida autossuficiente, com respeito às leis.
7.Habeas corpus não conhecido. Contudo, ordem concedida de ofício, para reconhecer o direito da paciente à remição da pena pela aprovação no ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio).
Sendo assim, com base sempre nos princípios basilares como a dignidade da pessoa humana, bem como em princípios destacados na própria lei de execução penal, um leque de opções se abrem para trabalhar a assessoria jurídica a pessoa privada de liberdade, é bom ficar sempre atento a tudo que acontece e contar com assessoria jurídica qualificada.
Estamos a disposição para atender a sua demanda, entre em contato.