Nos crimes sexuais cometido durante vulnerabilidade temporária da vítima, sob o amparo do art. 225 do Código Penal com a redação dada pela Lei n. 12.015/2009, a ação penal pública é condicionada à representação, conforme traz o informativo nº675, de 14 de agosto de 2020, do Superior Tribunal de Justiça.
O tema não é pacificado no próprio Superior Tribunal de Justiça, onde por exemplo a Quinta Turma segue a posição segundo a qual a vulnerabilidade, ainda que temporária, transforma a ação penal pelo crime de estupro em pública incondicionada, e a Sexta Turma tem-se o julgado do HC 276.510/RJ, em que se decidiu que a ação, nos casos de estupro de vítima em vulnerabilidade temporária é pública condicionada à representação.
Contudo, a superação do estado de vulnerabilidade é uma alteração na realidade fática que não pode ser ignorada no plano jurídico pelos julgadores.
A vulnerabilidade temporária ocorre quando a vítima tem a impossibilidade de expressar, momentaneamente, seu consentimento para o ato, como por exemplo a pessoa que bebe além da conta e este estado de embriaguez completa impossibilita ela de resistir.
No informativo do Superior Tribunal de Justiça destaca-se:
“A vulnerabilidade, como condição excepcional que é, geradora de situação desfavorável aos réus, tem de ser interpretada de forma restrita, em observância aos princípios da intervenção mínima do direito penal, da ofensividade, do contraditório e da presunção de inocência. Assim, uma vez cessada a vulnerabilidade, a ação penal pelos crimes sexuais deve continuar sendo pública condicionada à representação. Isso porque a ofendida, ao se recuperar do seu estado de embriaguez, tem restabelecidas todas as condições e recupera o discernimento necessário para tomar a decisão acerca da persecução penal ou não do agente causador do delito sexual.”
Confira a ementa:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. INADMISSIBILIDADE DO APELO NOBRE PELA ALÍNEA “C” DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADA. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E O PARADIGMA. POSSIBILIDADE DE CONHECIMENTO DO RECURSO PELA ALÍNEA “A” DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. VÍTIMA EMBRIAGADA INCAPAZ DE OFERECER RESISTÊNCIA. VULNERABILIDADE TEMPORÁRIA. AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA. REPRESENTAÇÃO. EXTEMPORANEIDADE. DECADÊNCIA.
1. Na espécie, não há como conhecer do apelo nobre com base na alínea “c”, porquanto a aventada divergência jurisprudencial não foi demonstrada nos termos exigidos pela legislação processual de regência. Isso porque, as teses jurídicas manifestadas no acórdão recorrido e no paradigma são divergentes, sendo certo que a solução adotada por eles é diversa em virtude da dessemelhança entre os suportes fáticos de cada um.
2. Entretanto, subsiste a interposição do recurso pela alínea “a” do permissivo constitucional, tendo em vista o adequado apontamento de violação ao art. 225, parágrafo único, do Código Penal.
3. A vulnerabilidade, como condição excepcional que é, geradora de situação desfavorável aos réus, tem de ser interpretada de forma restrita, em observância aos princípios da intervenção mínima do direito penal, da ofensividade, do contraditório e da presunção de inocência.
4. Nos casos de vulnerabilidade temporária, em que a vítima recupera suas capacidades físicas e mentais e o pleno discernimento para decidir acerca da persecução penal de seu ofensor, a ação penal dos crimes sexuais cometidos sob a égide da redação conferida ao art. 225 do Código Penal pela Lei n. 12.015/2009 deve ser mantida como pública condicionada à representação. Precedente da 6ª Turma.
5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. (REsp 1814770/SP, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 05/05/2020, DJe 01/07/2020)
Importante salientar que essa decisão é valida apenas para os crimes cometidos antes da publicação da lei 13.718 de 24 de setembro de 2018, que modificou a redação do art. 225 do código penal, transformando todos os crimes sexuais em ação penal público incondicionada, conforme vemos a seguir:
“Ação penal
Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública incondicionada. (Redação dada pela Lei nº 13.718, de 2018)
Parágrafo único. (Revogado). (Redação dada pela Lei nº 13.718, de 2018)”